Aurélia de Souza: O Autorretrato Como Manifesto de Arte e Feminismo

Reflexão, Identidade e Feminismo

Aurélia de Sousa Estudo para Autorretrato Santo António Reprodução a partir do negativo em vidro original Coleção MNSR
Aurélia de Sousa Estudo para Autorretrato Santo António Reprodução a partir do negativo em vidro original Coleção MNSR

Introdução

Hoje, 13 de junho, celebramos o aniversário de nascimento de Aurélia de Souza (1866-1922), uma das mais importantes pintoras portuguesas. A sua obra transcende os temas tradicionais das mulheres artistas do seu tempo, explorando a autorrepresentação e introspeção como forma de experimentação e afirmação.

O autorretrato sempre teve um papel central na história da arte, funcionando como uma declaração de identidade onde o artista se apresenta ao mundo, desafiando convenções sociais e artísticas. Aurélia insere-se nesta tradição, utilizando o autorretrato como ferramenta de questionamento da identidade, refletindo inquietações pessoais que acompanharam toda a sua vida.

Mas e hoje? As mulheres artistas têm finalmente o reconhecimento que merecem? Será que a luta de Aurélia de Souza e de tantas outras mulheres na arte e na sociedade foi suficiente para garantir igualdade? Ou será que continuamos a enfrentar desafios semelhantes, apenas com uma nova roupagem?


Aurélia de Souza e a Identidade Feminina na Arte

Autorretrato de casaco vermelho c. 1900
Autorretrato de casaco vermelho c. 1900

“A mulher que não tem medo da sua própria expressão desafia as regras impostas.” – Simone de Beauvoir

Aurélia de Souza não se limitou a criar retratos convencionais ou cenas decorativas. Ela usou a pintura para se afirmar num meio dominado por homens, explorando a autorrepresentação como forma de contestação e resistência.

O Impacto do Autorretrato com Casaco Vermelho

Com o Autorretrato com Casaco Vermelho (1900), Aurélia desafia o papel passivo atribuído às mulheres na arte. Vestida de forma austera, com um casaco masculino e um olhar fixo no espectador, ela rejeita os padrões de feminilidade impostos pela sociedade e assume uma posição de poder.

Esta obra insere-se numa linha de autorretratos que questionaram as normas artísticas e sociais:

  • Artemisia Gentileschi (Auto-retrato como Alegoria da Pintura, 1638-1639) – Retrata-se como uma mulher poderosa, desafiando a noção de que as mulheres não podiam ser mestres na pintura.
Autorretrato como alegoria da pintura Artemisia Gentileschi Óleo sobre tela 1638-1639
Autorretrato como alegoria da pintura Artemisia Gentileschi Óleo sobre tela 1638-1639
  • Élisabeth Vigée Le Brun (Autorretrato com Filha, 1786) – Representa-se como mãe e artista, contradizendo a ideia de que uma mulher não poderia ser ambas.
Auto-retrato com a filha, Julie, 1786. Elisabeth Louise Vigee Lebrun
Auto-retrato com a filha, Julie, 1786. Elisabeth Louise Vigee Lebrun
  • Frida Kahlo (Autorretrato com Espinhos e Colibri, 1940) – Usa símbolos para transformar o seu autorretrato num manifesto político e emocional, expressando dor e resistência.
Frida Kahlo (Autorretrato com Espinhos e Colibri, 1940)
Frida Kahlo (Autorretrato com Espinhos e Colibri, 1940)

A Sociedade em Transição: Ontem e Hoje

“A arte é a arma mais poderosa contra o silêncio imposto.” – Guerrilla Girls

No final do século XIX e início do século XX, Portugal era profundamente patriarcal. As mulheres tinham acesso limitado à educação e eram frequentemente excluídas dos círculos artísticos. Aurélia de Souza desafiou essas normas, matriculando-se na Academia Portuense de Belas-Artes e viajando para Paris, onde estudou na Academia Julian, uma das poucas instituições a aceitar mulheres.

Mas será que hoje estamos realmente tão distantes dessa realidade?

1. Representação Feminina na Arte Hoje

Embora tenha havido avanços, as mulheres continuam a enfrentar desigualdade na arte:

O mercado de arte privilegia artistas masculinos nos grandes leilões internacionais.

As obras de artistas femininas ainda são subvalorizadas em comparação com as dos homens.

Menos exposições individuais são dedicadas a mulheres nos grandes museus.

  • As obras de artistas femininas ainda são subvalorizadas em comparação com as dos homens.
  • Menos exposições individuais são dedicadas a mulheres nos grandes museus.
  • O mercado de arte privilegia artistas masculinos nos grandes leilões internacionais.

A exposição “Tudo o que eu quero — Artistas Portuguesas de 1900 a 2020”, realizada na Fundação Gulbenkian, revelou que muitas mulheres artistas foram ignoradas ao longo da história, apesar da sua qualidade e inovação.

E tu? O que estás a fazer para mudar esta realidade?

Tudo o que eu quero — Artistas Portuguesas de 1900 a 2020 Fundação Gulbenkian
Tudo o que eu quero — Artistas Portuguesas de 1900 a 2020 Fundação Gulbenkian

O Autorretrato como Manifesto

“Se não posso contar minha própria história, então quem a contará por mim?” – Aurélia de Souza

Autorretratos Icónicos da História da Arte

Desde o Renascimento até à contemporaneidade, o autorretrato tem sido uma forma de resistência e afirmação pessoal. Aqui estão alguns dos mais icónicos autorretratos da história da arte:

Aqui estão alguns dos mais importantes autorretratos da história da arte:

  • Gustave Courbet – O Desespero (1845) – Expressão crua de sofrimento, um autorretrato emocional e psicológico.
  • Leonardo da Vinci – Autorretrato (1512) – Reflexão sobre envelhecimento e sabedoria.
  • Diego Velázquez – As Meninas (1656) – Questionamento sobre o papel do artista na sociedade.
  • Rafael – Autorretrato (1504-1506) – Imagem serena e confiante, explorando a ideia de identidade artística.
  • Rembrandt – Série de Autorretratos – Narrativa visual da sua vida ao longo do tempo.

Gustave Courbet – O Desespero (1845)
Gustave Courbet – O Desespero (1845)

Hoje, a autoexpressão não se limita à pintura. Os autorretratos modernos incluem fotografia, arte digital e até redes sociais, onde a identidade é constantemente reinventada.


Desafio ao Leitor/Estudante

“Não basta olhar para a história. É preciso ser parte dela.” – Angela Davis

Para refletires sobre o teu papel na sociedade e na arte, proponho um desafio:

  1. Cria um autorretrato que reflita a tua identidade e as tuas inquietações.
  2. Incorpora símbolos que representem a tua visão sobre a sociedade e a igualdade de género.
  3. Escreve um texto sobre o que quiseste transmitir com a tua obra.
  4. Partilha a tua reflexão e debate com outros estudantes/artistas.

Será que a arte ainda pode ser uma forma de resistência social? Será que a tua identidade visual pode influenciar a forma como o mundo te vê?


Conclusão

Aurélia de Souza foi muito mais do que uma pintora; foi uma mulher que se recusou a ser invisível num mundo que não lhe concedia espaço. Mais de um século depois, a sua luta ainda ressoa, pois a arte e a sociedade continuam a desafiar o papel da mulher na cultura.

Mas e tu?
Como te representas no mundo?
Como podes contribuir para a igualdade de género na arte e na sociedade?
O que diz a tua expressão visual sobre ti e sobre o mundo?

Efetue aqui o download do catálogo Raisonné Aurélia de Souza disponibilizado pelo Museu Nacional Soares dos Reis

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